terça-feira, 26 de outubro de 2010

Cuidados necessários para a publicação de uma notícia

Ser jornalista não é tão simples como parece. Além dos problemas rotineiros da profissão, como, por exemplo, o curto tempo para escrever uma matéria e a incessante busca por informações e fontes, o profissional de comunicação precisa se preocupar com o conteúdo a ser divulgado para não virar alvo de um processo judicial.


Como formador de opinião da sociedade, deve estar ciente que o seu trabalho pode ofender alguém ou alguma instituição, mesmo não sendo este o objetivo. Como foi o caso da jornalista Elvira Lobato, da Folha de S.Paulo, que foi processada pela Igreja Universal do Reino de Deus (IURD) por ter publicado, em 2007, a matéria “Universal chega aos 30 anos com império empresarial”, na qual ela conta em detalhes o esquema de enriquecimento ilícito dos bispos da IURD.

A instituição religiosa perdeu o processo e a jornalista acabou ganhando o Prêmio Esso de Jornalismo em 2008, pelo ótimo trabalho de apuração de sua reportagem. Este é um bom exemplo de jornalismo comprometido com a verdade, pois a defesa do jornal conseguiu provar que a notícia foi realizada de forma legal, ou seja, sem usar informações de um processo em segredo de Justiça ou de documentos sigilosos.

A juíza Carolina Nabarro Munhoz Rossi, da 5ª Vara Cível de Guarulhos (SP), explica como um jornalista pode evitar processos sobre usa pessoa ou sobre a empresa para a qual trabalha: “Primeiramente ele deve verificar se o processo não corre em segredo de Justiça, pois nesse caso qualquer divulgação de dado do processo é crime. Alguns processos que envolvem menores de idade, crimes sexuais ou questões que necessitam de sigilo para a investigação, como aqueles que contêm interceptações telefônicas, por exemplo, correm em segredo de Justiça. Nesse caso, pratica crime quem informa o dado ao jornalista e ele, ao divulgar. O responsável pelo jornal também pode responder”.

Uma dica importante para todo jornalista é sempre checar as informações antes de publicá-las, porque caso a notícia seja bem checada, o jornalista certamente terá sua defesa facilitada e o risco de perder o processo é menor. Além disso, é essencial avaliar quais os interesses em jogo acerca da informação obtida e pensar o que as pessoas envolvidas nesta divulgação podem perder com ela.

Apesar de ser uma das regras básicas do jornalismo, a checagem não é garantia de não sofrer ações judiciais, como explica a advogada e consultora Laura Rodrigues, da empresa Lex Editora. “Mesmo sendo a reportagem fundada em documentos válidos e obtidos legalmente, o jornalista é responsável por aquilo que escreve. A forma como a informação será transmitida ao público é essencial. O texto deverá ser redigido de forma imparcial, sem expressar juízos de valores quanto a moral e a pessoa que é objeto da reportagem.”

No jornalismo da atualidade, onde dar uma notícia antes dos outros veículos é de suma importância, a pressa se torna uma grande inimiga. O relacionamento com as fontes é vital para o exercício da profissão, porém não se pode confiar cegamente nelas sem ter uma verificação por outros meios.

“Cuidado com as fontes, mesmo que você confie nelas, não publique uma informação só porque sua fonte lhe passou, verifique a veracidade da mesma”, afirma o jornalista William Correia, do jornal Agora, que pertence à Folha de S.Paulo. Esse cuidado é importante, já que no Brasil as fontes têm sigilo absoluto e uma informação publicada em um veículo é de responsabilidade do mesmo, não se pode culpar a fonte por ter ludibriado o jornalista.

Mas se um jornalista cometer algum dano material, que se refere àquilo que é físico, ou moral, que tem haver com o espírito, ou seja, aquilo que eu sinto, ele pode ser obrigado a indenizar alguém. “O juiz analisa caso a caso, verificando qual o abalo sofrido, qual a possibilidade econômica de cada parte. O valor tem que servir de exemplo para que a pessoa não haja mais daquela forma, mas não pode servir como forma de enriquecimento para quem foi ofendido de forma à ofensa ter sido um bom negócio”, conta a juíza Carolina Nabarro.

Também é bastante comum em ações judiciais contra a impressa, a calúnia, a injúria ou a difamação estarem presentes no processo. Se o texto não estiver embasado na verdade, a defesa do jornalista pode ter problemas, como afirma a juíza Nabarro. “Não dá para se defender de injúria e difamação. Calúnia (imputar falsamente a prática de crime) dá para fazer a exceção da verdade, que é a prova de que a pessoa praticou o crime que foi imputado a ela. A calúnia é mais grave e a pena pode chegar a dois anos, mais um terço por ser feita através da imprensa.”

Além da indenização, o ofendido pode pleitear um direito de resposta, que é utilizado quando há divulgação de informação inverídica ou ofensa à honra. No caso de imprensa escrita, tem que ocorrer na mesma página, mesmo tamanho, de preferência no mesmo dia da semana. Na TV ou no rádio, deve ser no mesmo programa, mesmo horário, mesmo tempo. O direito de resposta visa diminuir o impacto da notícia negativa e a indenização visa reparar o abalo sofrido.

“Para evitar processos, a principal recomendação é realizar o trabalho da forma mais ética possível. Não é aceitável aumentar a informação para vender jornal e muito menos publicar mentiras”, orienta William Correia. Também com toda velocidade da internet, as informações são transmitidas praticamente em tempo real, por isso o cuidado na hora de qualquer divulgação é essencial.

Outra área que gera muitas discussões e é alvo de processos é o fotojornalismo. Uma boa notícia vem sempre acompanhada de ótimas fotos, que serão responsáveis por atrair mais o leitor. Porém, ser fotógrafo exige certa responsabilidade ética, assim como escrever uma matéria. “Para evitar processos, basta ser fiel a essência do jornalismo, ou seja, apurar a informação, ouvir ou observar, no caso de quem trabalha com imagem, os dois lados da história e fazer juízo imparcial. No entanto, o fotojornalista ou repórter fotográfico não deve ir a uma pauta preocupado com a possibilidade de ser processado”, orienta o fotógrafo César Greco.

Para quem está iniciando no fotojornalismo, Greco explica que é importante “observar, conversar e pedir opiniões sempre que possível a colegas mais experientes, aplicar os ensinamentos sobre ética e legislação adquiridos no curso de jornalismo, e acima de tudo, refletir todo o contexto da pauta em relação ao material fotográfico obtido.”

Reter o poder de informar a sociedade é uma grande responsabilidade que cabe a poucos, às vezes esse poder sobe à cabeça do jornalista, que se sente intocável e pode divulgar informações sendo mal intencionado, com o objetivo apenas de prejudicar alguém. Por isso, cabe a justiça analisar cada caso e punir a imprensa quando a mesma cumpre sua função de forma errônea. Com isso, ela separa os jornalistas mal intencionados daqueles que realmente possuem o compromisso com a verdade.

Texto de Romário Ferreira, Felipe Salomão e Vinícius Veloso.

sábado, 2 de outubro de 2010

A deficiência não é o problema

Falta de apoio e descaso de alguns governos são os principais obstáculos que os atletas paraolímpicos enfrentam no Brasil. Nas Paraolimpíadas Escolares 2010, destaque para o Rio de Janeiro

Por Beto Monteiro
Superação e força de vontade não faltaram para os mais de 800 jovens que participaram da quarta edição das Paraolimpíadas Escolares. A competição é o maior evento do gênero realizado em todo o mundo e aconteceu em São Paulo, entre os dias sete e dez de setembro. A equipe do Rio de Janeiro foi a grande campeã.

Este ano, mais duas modalidades entraram na grade de provas, são elas: tênis em cadeira de rodas e voleibol sentado; além de atletismo, futebol para cegos, futebol de sete para paralisados cerebrais, judô, goalball, bocha e tênis de mesa. Ao todo, 21 estados brasileiros, mais o Distrito Federal, participaram da competição, que ocorreu no Clube Espéria, no Espaço SPturis e no Ibirapuera.

No entanto, apesar de ser tão importante para os estudantes do país, a competição não tem a divulgação que merece e que todos os participantes sonham. Na verdade, a falta de divulgação é um dos principais obstáculos que os alunos enfrentam e não a própria deficiência em si. Outra dificuldade é a falta de professores especializados em ensinar os esportes adaptados aos jovens.

Dificuldades a parte, quem fez bonito este ano foi a delegação do Rio de Janeiro, que venceu cinco das dez modalidades das Paraolimpíadas. Os cariocas fizeram 65 pontos na classificação geral. São Paulo foi o segundo com 44 pontos, e o Distrito Federal ficou em terceiro com 38. Além de ser o campeão, o Rio ganhou o troféu Confraternização, após uma votação, da qual participaram todos os estados, para eleger a delegação mais organizada, animada e com o maior espírito esportivo.


Por Romário Ferreira
A animação dos cariocas pôde ser notada durante a partida final do futebol de sete para paralisados cerebrais, a qual eles venceram o Mato Grosso do Sul por nove a três. Na arquibancada da quadra, os torcedores gritavam o tempo todo e chamavam cada um de seus atletas pelo nome. Infelizmente, nenhuma outra equipe teve o mesmo apoio fora das quatro linhas – nem mesmo a equipe paulista, a anfitriã, que levou 161 pessoas ao evento, sendo 111 atletas. O Rio de Janeiro contou com 160 pessoas (100 atletas) e o Distrito Federal participou com 126, sendo 78 atletas.

O atleta carioca Fabio Bordignon, de 18 anos, foi o principal jogador do futebol de sete da competição e acabou como artilheiro, com 14 gols. Ao término da final, após gritar “é campeão”, ele falou à Revista em Família sobre a importância das Paraolimpíadas. “Ela é muito importante para revelar atletas para a Seleção Brasileira e até para os clubes, apesar da pouca divulgação. Nós agradecemos ao Comitê Paraolímpico por ter feito esta competição, que pode revelar vários jogadores para o Brasil”, contou Bordignon, que já faz parte da Seleção Brasileira em sua modalidade.


“O Rio de Janeiro (o governo do estado) dá muito apoio ao atleta paralisado cerebral. Lá existem vários times e também campeonatos estaduais. Por exemplo, a Andef (Associação Niteroiense dos Deficientes Físicos), que é o meu clube, tem um centro de treinamento enorme onde todos os jogadores podem treinar e manter a forma física. O ruim é que nem todos os estados tratam o paraolímpico desta forma. O Rio é um exemplo”, explicou Fabio Bordignon. Na competição, a delegação carioca levou para casa 66 medalhas de ouro, 32 de prata e 21 de bronze.


Gilmar Chavão, um dos treinadores das equipes de futebol de sete e natação do Rio de Janeiro, também acredita que o desporto paraolímpico ainda carece de um apoio maior no Brasil. “Na Europa, por exemplo, dá para perceber que existe uma visibilidade maior com relação a treinamento e trabalhos especiais, não é como aqui. O apoio é fundamental, porque quanto mais o atleta treinar, maior será o seu rendimento”, afirmou.

Equipe paulista
Conquistou 29 medalhas de ouro, 26 de prata e 19 de bronze. Alguns esperavam um desempenho melhor da anfitriã, no entanto, o presidente do Comitê Paraolímpico Brasileiro (CPB), Andrew Parsons, elogiou a atuação dos alunos paulistas. “São Paulo foi muito bem, era a delegação da casa e ficou em segundo lugar geral, logo atrás do Rio de Janeiro. Teve uma equipe grande, com representantes em várias modalidades. É uma delegação da qual podemos esperar muito, que tem potencial para ano que vem ficar em primeiro. Será uma disputa ainda mais acirrada”, disse Parsons.

Já Terezinha de Oliveira Nunes, mãe do atleta Jonathan Nunes, da equipe de futebol de sete de São Paulo, não aprovou a atuação dos paulistas nesta modalidade. “Não houve apoio para os garotos. O time foi formado as pressas e praticamente não jogou junto antes. Eles perderam quase todos os jogos. Essa equipe treina em Suzano (na Grande SP). Nós somos de lá, mas a maioria do time não. Alguns saem aqui da capital e vão para lá. E também só treinam uma vez por semana”, reclamou Terezinha. O time paulista ficou na quarta colocação, após perder a disputa de terceiro lugar para o Distrito Federal, por 13 a zero.

Perguntada sobre como fizeram para chegar até o local onde estava sendo realizados os jogos, ela disse que foi obrigada a pegar ônibus, trem e metrô, pois não existe apoio por parte do governo. Quando o time precisa viajar, mesmo a distância sendo longa, eles geralmente vão por conta própria de ônibus. Muito diferente dos cariocas, que vieram – até a torcida – todos de avião.

“Meu filho tem o sonho de andar de avião, porém, nunca teve oportunidade. Uma vez quase deu certo, mas não havia verba para bancar a ida de todo o grupo”, lembrou a mãe. “Ele já foi jogar no Mato Grosso do Sul, no Rio de Janeiro, em Brasília, em Curitiba, entre outros lugares. Em quase todas as vezes, nós que pagamos a viagem”, completou.

A única modalidade em que São Paulo foi o primeiro colocado foi no tênis de mesa, no qual conseguiu quatro medalhas de ouro. Em outros três esportes os paulistas ficaram em segundo lugar: atletismo (17 ouros), natação (34 ouros) e voleibol sentado (medalha de prata).

Organização
Para os organizadores das Paraolimpíadas Escolares 2010, o evento foi um sucesso. “A organização foi muito boa, principalmente no que tange à parceria do Comitê Paraolímpico Brasileiro com a Secretaria Estadual dos Direitos da Pessoa com Deficiência, e com a Secretaria Municipal dos Direitos da Pessoa com Deficiência e Mobilidade Reduzida de São Paulo, para a realização do evento. Além disso, tivemos aumento no número de modalidades (de oito para dez), na quantidade de atletas (de 500 para mais de 800) e no número de estados participantes (de 20 para 22, com a entrada de Goiás e Rio Grande do Sul)”, comemorou Andrew Parsons, presidente do CPB.

Por Romário Ferreira

A primeira edição das Paraolimpíadas Escolares aconteceu em 2006, em Fortaleza, com apenas natação e atletismo. No ano seguinte, em Brasília, foram acrescidos o tênis de mesa e o goalball à competição. Em 2008, não houve evento, e no ano passado, ocorreu a terceira edição, também em Brasília.

Sobre o desempenho dos estados em 2010, Parsons afirmou que “nenhuma delegação decepcionou e que a disputa entre Rio de Janeiro, São Paulo e Distrito Federal foi muito boa, o que deu ainda mais emoção à competição.”

Em conversa com vários atletas de diferentes esportes durante a competição, foi possível notar que a grande expectativa são as Paraolimpíadas de 2016, no Rio de Janeiro. Apesar da falta de apoio de alguns estados, os jovens acreditam que podem fazer bonito na competição mundial. Esta também é a opinião do presidente do CPB, Andrew Parsons.

“Temos uma meta traçada que é alcançar o quinto lugar geral e estamos trabalhando para cumpri-la. Quanto a esses jovens, podemos esperar muito deles. As Paraolimpíadas Escolares mostraram que temos um potencial muito grande, com jovens talentos em diversas modalidades. Aliados aos atletas de talento que já estão aí, o Brasil tem um enorme potencial para Rio 2016. Agora cabe a nós do CPB, junto às confederações, federações e clubes, trabalhar esses novos atletas”, prometeu Parsons. É esperar para ver.

*texto de Romário Ferreira, publicado na 3ª edição da Revista Em Família.